Recuperação de vegetação da Mata Atlântica pode trazer retorno financeiro quando realizada em grande escala

A Mata Atlântica é a segunda maior floresta brasileira em extensão e o bioma brasileiro com maior déficit para cumprimento do Código Florestal, com aproximadamente 7 milhões de hectares passíveis de recomposição florestal. A maior parte dessa área é protegida como Áreas de Proteção Permanente – (APP, aproximadamente 4 milhões de hectares) ou Reserva Legal (RL, aproximadamente 2,7 milhões de hectares). A recuperação da vegetação nativa é um desafio ambiental e econômico para o país, com impactos para segurança alimentar, regulação do clima, disponibilidade de água, desenvolvimento humano e competitividade agrícola no cenário internacional.

A Agroicone realizou um estudo que demonstrou como a abordagem de restauração em escala de paisagem, utilizando modelos produtivos, pode incentivar os produtores rurais a investir em restauração ecológica de suas propriedades. O estudo considerou uma combinação de fontes de financiamento público e de organizações nacionais e internacionais, com fundos reembolsáveis ou não reembolsáveis. Uma das conclusões é que uma ação coordenada entre organizações públicas, privadas e não governamentais contribuirá para maior articulação com produtores rurais e maior viabilidade dos projetos.

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As análises foram feitas para três grandes regiões de Mata Atlântica onde há muitas Unidades de Conservação (UCs), ou seja, onde existe bastante vegetação nativa. São elas o Mosaico de Áreas Protegidas do Extremo Sul da Bahia (MAPES), com aproximadamente 1,6 milhões hectares, incluindo 12 municípios; o Mosaico de Unidades de Conservação da Mata Atlântica Central Fluminense (MCF), que tem forte influência da região metropolitana do Rio de Janeiro, com aproximadamente 1,1 milhão de hectares, incluindo 23 municípios; e o Mosaico Lagamar, com aproximadamente 1,2 milhão hectares, incluindo os municípios do litoral Sul de São Paulo e todo o litoral do Paraná.

Promover a restauração em escala faz toda a diferença para gerar oferta suficiente e desenvolver mercado. Um dos benefícios é a redução de custos de assistência técnica e compra de insumos, pois ao negociar preços para o conjunto de propriedades em uma área é possível obter maior vantagem do que nos casos em que a recuperação dessas propriedades seja realizada individualmente pelos produtores.

Adicionalmente, na abordagem da recuperação em escala de paisagem, o objetivo é balancear a demanda pelo uso da terra de forma ideal ao bem-estar humano e ambiental. “Isso quer dizer criar soluções considerando produção de alimento, renda familiar, segurança alimentar, restauração ecológica e desenvolvimento econômico da comunidade”, explica Luciane Chiodi, sócia da Agroicone e coautora estudo.

Nas três regiões, a Agroicone trabalhou com consultorias regionais para desenvolver modelos de recuperação com e sem finalidade econômica, que poderiam ser implementados com ou sem financiamento, com implementação que poderia ser dividida em até três fases. Ficou claro em todas as regiões analisadas que a implementação em fases aumenta viabilidade do projeto, porque reduz a necessidade de desembolso direto, amplia oportunidade de financiamento e, além disso, as receitas geradas nas primeiras fases com a venda dos produtos da restauração podem ser utilizadas para financiar as etapas seguintes.

Por exemplo, no caso da região Sul da Bahia (MAPES), considerando a área de 37.418 hectares disponíveis para recuperação, o custo total será de R$ 2,7 bilhões em valores nominais ao longo de 20 anos (em média R$ 72 mil/ha). A necessidade de financiamento nesse cenário é de R$ 734,5 milhões, dos quais o montante de R$ 84,2 milhões representam custos não operacionais, que poderiam ser financiados com recursos de fundos não reembolsáveis.

Ao longo do período total de 20 anos, a comercialização de produtos como sapucaia, cacau e açaí vai gerar receitas aos produtores no valor de R$ 1,5 bilhão, R$ 1,2 bilhão e R$ 660 milhões, respectivamente. “Os produtores poderão obter receitas com a comercialização de produtos da restauração desde os primeiros anos. Nós identificamos oportunidade tanto para os produtos bem conhecidos, como é o caso do cacau, açaí e cupuaçu, quanto produtos que apresentam grande potencial de mercado como é o caso da sapucaia, que produz uma castanha cada vez mais valorizada no setor de turismo da região”, explica Luciane.

O tempo necessário para retorno do investimento (payback) nesse cenário seria entre 8 anos (com financiamento) e 10 anos (sem financiamento). Adicionalmente, nesse modelo, a restauração traz possibilidades de receitas entre R$ 37 milhões e R$ 118 milhões com a comercialização de crédito de carbono.

Considerando diferenças entre as regiões analisadas, persistem estratégias que podem impulsionar a recuperação de vegetação nativa da Mata Atlântica. “Acreditamos na articulação de um pacto de governança envolvendo setores público, privado e do terceiro setor para transformar boas ideias em projetos viáveis”, afirma a sócia da Agroicone e coautora do estudo Laura Antoniazzi.

O estudo conclui que as condições para promover a economia da recuperação florestal existem: passivos ambientais a serem recuperados, capacidade instalada para implementação dos projetos e linhas de financiamento aderentes. Fatores determinantes são uma estratégia de governança, combinação de fontes de financiamento e envolvimento de organizações locais para engajamento e apoio aos produtores rurais.

Esse estudo foi desenvolvido no âmbito do Projeto Biodiversidade e Mudanças Climáticas na Mata Atlântica (Projeto Mata Atlântica) – coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente no contexto da Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável Brasil-Alemanha. A equipe da Agroicone que liderou esse estudo é formada por Luciane Chiodi e Laura Antoniazzi, sócias da Agroicone, e Lucas Gabriel de Paula Silveira, pesquisador da Agroicone.

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